Entrevista ao grupo Capim Seco-BH
Os Sobrinhos da Música Brasileira!
• Postado por Michelle Andreazzi
Grupo Capim Seco(BH)
foto: Marcio Guima
A história começa assim: O Capim Seco estava em trio fazendo mais um samba no Alfândega Bar. Eu cantando e tocando pandeiro, o Bidu cantando e tocando violão e o Luizão na “percuteria”. O show estava mais intimista, o público ficou sentadinho ouvindo e cantando as músicas. Em meio a esses que ouviam em silêncio nossas interpretações apareceu um rapaz que de olhos fechados se deleitava com as canções. Esse rapaz puxou conversa com o Júlio, um dos donos da casa, e disse que estava gostando muito do grupo, que a cantora o fazia lembrar sua tia... O Júlio nessa hora deve ter imaginado aquela senhora velhinha, do coral da igreja e com muito vibrato na voz. Mas então o rapaz completou: - Minha tia Clara!
Isso mesmo, o tal moço é sobrinho da nossa “Deusa dos Orixás”, Clara Nunes. Seu Nome é Marcio Guima, e ele é também cantor e compositor.
Aproveitamos a oportunidade pra conhecê-lo e descobrimos que ele freqüentava os shows do Capim nos primeiros anos de banda, quando tocávamos no “Fuxiquim”. Aí a festa se instalou, ele subiu no palco e fizemos uma série de músicas em homenagem à Clara Nunes. Cantamos de ”Portela na Avenida” (Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro), a “As Forças da Natureza” (João Nogueira e Paulo Cesar Pinheiro) e pra completar ainda fizemos uma entrevista com ele.
Marcio nos contou que aprendeu violão com sua mãe, Vincentina, e que sempre tinham o costume de ouvir atentamente os discos da ”tia Clara” em casa. Disse da influência recebida em sua carreira e de sua grande admiração por Clara: “Aos 15 anos tive a coragem de mostrar a ela minha primeira composição esperando sua aprovação e crítica. Participava nesta época (anos 80) de festivais no interior de Minas. Clara sugeriu-me vir para BH, e estudar música, canto. Fiz o combinado e estou desde 1984, um ano após sua morte exercendo o ofício musical. Hoje sempre que posso faço homenagens a ela.”
foto Clara Nunes: Wilton Montenegro
Sobre a sua família Guima conta: “Minha mãe é Vicentina Pereira Gonçalves, irmã de Clara, nascida em 1936 em Caetanópolis, terra natal de Clara Nunes, antiga Cedro, distrito de Paraopeba. Todos os sete irmãos (José, Ana Filomena, Maria Gonçalves, Joaquim, Valdemira, Vicentina e Clara) trabalharam em fábrica de tecidos, a Cedro Cachoeira, em Caetanópolis. Na vinda para Belo Horizonte, em 1958 minha mãe foi quem trouxe primeiramente dois irmãos para trabalhar também em fábrica de tecidos, a Renascença no bairro de mesmo nome em BH. No ano seguinte veio Clara, com 17 anos e logo foi contratada também trabalhar lá. Foi operária de 1958 a 1963, intercalando com a música que era inicialmente uma diversão e logo passou a ser profissão(...)”
Marcio falou também da trajetória artística de sua tia, no entanto, acredito que o mais interessante neste encontro é publicar suas memórias e impressões pessoais. Por isso a biografia de Clara ficará por conta, pra quem se interessar, de Vagner Fernandes com o livro “Guerreira da Utopia” e aqui deixo apenas o relato íntimo do sobrinho Márcio: “Para mim existe duas Claras. A Clara Nunes consagrada como artista, e a tia Clara como aprendi a chamá-la desde criança. Suas vindas a BH eram em festas de fim de ano e shows no Palácio das Artes, Minas Tênis e etc. Ela passava o Natal e Revellion conosco curtindo férias em Caetanópolis, visitando amigas e parentes da região. Sua simplicidade e mineirice faziam desse período a alegria da família e irmãos. A Dindinha (irmã mais velha de Clara) foi quem a criou, já que ela ficou órfã muito cedo, aos 4 anos. Sua casa em Caetanópolis virava um ponto de encontro no final de ano para amigos e fãs. Clara nunca negava uma foto, um autógrafo, uma atenção aos admiradores.
Minha lembrança mais antiga remete aos brinquedos que ganhava, as rodas de música em família, as folias de rei que ela se emocionava ao assistir, aos irmãos em volta com os casos antigos, e o carinho que tinha com os sobrinhos, já que Clara se emocionava com crianças. Desejo de ser mãe negado pela natureza.”
Marcio Guima manifestou em nossa entrevista mais que sua admiração pela pessoa Clara Nunes, manifestou a admiração que também nós do Capim temos pelo legado da artista. “A obra gravada por Clara Nunes é atemporal, não datada. Ficou para toda uma nova geração, e a qualidade musical de seus sucessos é incontestável. Sua grande preocupação era trazer compositores compromissados com a boa música brasileira, e teve a felicidade de cantar grandes compositores como Paulinho da Viola, Chico Buarque, Candeia, João Nogueira, Paulo César Pinheiro, dentre tantos.
A mística de seu trabalho é outra dimensão que a torna um mito com todo simbolismo da afro-religião-brasileira, que ninguém mais que ela soube retratar. Hoje ,Clara Nunes é um ícone dessa manifestação.(...) ”
Sobre o encontro com o Capim Seco e a nossa relação com a obra de sua tia Marcio diz: “Fico feliz ao ver o grupo Capim Seco cantar coisas da Clara Nunes e o público logo se identificar. Michelle é afinadíssima e tem uma bela voz. O grupo tem harmonia e o repertório é de primeira qualidade buscando as raízes da boa música brasileira. Lembro do grupo desde o início em bares de BH e sempre os admirei. Desejo-lhes sucesso, o que tenho certeza que com o primeiro CD será aberto ao grande público o talento dos mineiros do Capim Seco.”
Para nós do Capim Seco foi um encontro inesperado, mas ao mesmo tempo muito rico cultural e artisticamente. Aos que não estavam lá fica a nossa entrevista e as fotos, e que venham sempre, os sobrinhos, os filhos e os netos dos grandes artistas ao nosso encontro. Porque somos da mesma família! Herdeiros da música e cultura brasileira.
Salvem Clara, salvem a cultura afro-brasileira, salvem os sobrinhos da música brasileira!
Obrigada Márcio!
Michelle Andreazzi
www.alfandegabar.com.br
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